As esculturas surpreendentes de Michel Torres Costa já estão conquistando admiradores até no exterior
Na Idade Média, os alquimistas, trancafiados em seus laboratórios, buscavam transformar qualquer metal em ouro. Como se pode imaginar, não era assim uma tarefa simples. Mas a ideia da transmutação, de dar valor ao que para as demais pessoas seria material a ser descartado, é o que move e inspira o artista Michel Torres Costa. Não por acaso ele mesmo se define como um alquimista dos metais.
Ainda que sempre flertasse com a arte, Michel, natural de Tubarão, começou a trabalhar por volta dos 15 anos como soldador na antiga Emetu, empresa que atuava no ramo de esquadrias metálicas.
Era ajudante do pai, e foi com ele que aprendeu muito de seu ofício. Mas aos 25 anos, casado, começou a se cansar da rotina da empresa, afinal precisava passar muitos dias longe de casa, em outras cidades, a trabalho. Queria estar perto da família.
Quando anunciou que iria abandonar o emprego, o pai não gostou da ideia. Aconselhou o filho a cursar uma faculdade, trabalhar em um escritório, buscar estabilidade. Não entendia como Michel iria viver de arte. Até que, ao ver as primeiras criações do filho artista-alquimista, começou a aceitar melhor a sua decisão, mais ainda depois de vislumbrar que, sim, aquilo poderia ser um bom negócio.
O pai não sabia explicar ao certo o que Michel fazia, mas, sempre que alguém lhe perguntava, ele tinha uma resposta simples mas ao mesmo definitiva, que pela referência não deixava dúvida.
“Meu filho é igual o Willy Zumblick”, respondia, com orgulho. Pronto, estava explicado: o filho é um artista e sabe viver de seu ofício.
Michel, hoje com 33 anos, foi criado no bairro de Monte Castelo; agora vive com a esposa Gabriela Bressan, grávida do primeiro filho do casal, em uma casa entre o Caruru e a Guarda Margem Esquerda. É um local pacato, típico de interior, onde se chega por uma estrada de chão batido. Ali, em meio à tranquilidade, Michel dá vida às suas ideias.
Do “Durepoxi” às sucatas de metal
Seu gosto pela escultura começou cedo, ainda em criança. Primeiro foram as massinhas de modelar, depois, aos 22, a primeira escultura de fato, em “Durepoxi”: um Kratos, personagem de jogo eletrônico da franquia God of War. Exigente, Michel não gostou do resultado, mas o trabalho surpreende, já pela qualidade do entalhe e riqueza de detalhes. Não parou mais: começou a fazer cursos e a estudar sobre a arte cada vez mais.
Primeiro, foram as réplicas em miniatura de personagens do cinema. Era então um hobby, mas que tinha mercado entre os colecionadores. “Percebi que dava para fazer o que gosto e vender”, lembra. Mas, por volta dos 25, viu-se descontente, querendo explorar outros ramos da escultura, em vez de apenas reproduzir personagens marcantes. “Como artista não tinha liberdade para fazer. Abandonei os colecionáveis”, conta.
A mudança para os metais, que resultam em obras impressionantes (vide o sucesso de Michel nas redes sociais), deu-se quando, em visita ao cunhado, viu no chão peças de moto que iriam para o lixo. Foi então que entrou em cena o alquimista dos metais.
Daquele amontoado de entulho, aparentemente sem valor, Michel lançou mão de sua experiência como soldador e lhe deu um destino mais nobre. Peça por peça, como quem monta um quebra-cabeça, ele esculpiu um cavalo.
A certeza de que aquele seria seu caminho veio quando ouviu o conselho de um empresário. “Ele me disse para reaproveitar materiais, ressignificar”, recorda-se.
Em seguida fez uma onça, da qual não se desfaz em nenhuma hipótese. Afinal, foi um de seus primeiros trabalhos e, por isso, a mantém até hoje em posição de destaque no ateliê.
Urubu-rei, sol e coração: novas artes a caminho
Com suas obras em metal repercutindo na internet, e vídeos e fotos recebendo engajamento cada vez maior, as redes sociais se tornaram vitrine e ambiente ideal para atrair clientes dispostos a investir em arte – inclusive no exterior, como foi o caso da escultura de um rosto, adquirida por uma pessoa nos Estados Unidos.
“O que ele deve ter visto na minha obra?”, perguntou-se Michel, ao assistir à sua obra, produzida no interior de Tubarão, ganhando o mundo. “Comecei a me dedicar ainda mais para melhorar meu trabalho”, comenta. Às vezes ele esculpe sobre moldes de gesso, às vezes à mão livre, “no olho”; de qualquer forma sempre resulta em um trabalho que surpreende ao elevar à arte o que seria mera sucata.
Até setembro Michel está com a agenda repleta de encomendas. Há poucos dias finalizou uma peça que será enviada ao Rio de Janeiro. Trata-se de uma onça feita com utensílios domésticos, de colheres a escumadeiras. Um pavão recém-concluído consumiu 305 colheres e 807 garfos, e será exportado para os Estados Unidos. São materiais que ele vai amealhando em ferros-velhos e oficinas mecânicas. “Vou garimpando”, diz.
Uma escultura leva em média 40 dias para ficar pronta. Em seu currículo já são 45 peças de metal entregues aos clientes, mas, considerando as que ainda estão no ateliê, a lista sobe para 51. A próxima escultura será um urubu-rei, e depois virão um sol e um coração. O contato com os clientes, a negociação, foi encampado pela esposa Gabriela.
Com isso, sobra tempo para Michel mergulhar de cabeça em sua alquimia particular: “Acordo para brincar todo dia. Esse é meu trabalho”.
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