Estudo mostra impacto da presença policial e estigmatização de moradores
Um relatório produzido pelo Instituto Memória e Direitos Humanos (IMDH) da UFSC em parceria com a Udesc revela o medo e a sensação de vulnerabilidade que moradores de comunidades da Grande Florianópolis enfrentam diante da atuação policial. O documento, intitulado Representações da Violência Policial: rodas de conversa com comunidades e profissionais de Florianópolis, foi publicado em junho e traz relatos colhidos entre 2021 e 2024.
Foram realizadas 13 rodas de conversa com 115 pessoas, incluindo moradores, membros da Defensoria Pública e do Ministério Público de Santa Catarina. O objetivo das pesquisas foi criar um espaço de escuta qualificada, permitindo que os moradores compartilhassem experiências sobre abordagens policiais e impactos da violência institucional.
Segundo o relatório, a presença do Estado nas comunidades é marcada pela violência e pelo controle, enquanto políticas públicas de bem-estar, lazer e cultura são quase inexistentes. A professora Clarissa Dri, integrante do IMDH, destaca: “O Estado é praticamente ausente em termos de política pública, mas muito presente com relação às forças policiais”.
Os relatos evidenciam abusos de poder, abordagens violentas e restrição de circulação. Moradores descrevem situações em que operações policiais impedem o acesso a atividades essenciais, como ir à escola ou prestar vestibular, e relatam que mesmo mostrando documentos, são tratados com suspeita e hostilidade.
A pesquisa aponta que o medo é um fator que impede denúncias: moradores muitas vezes não sabem a quem recorrer ou temem represálias, já que delegacias e prédios públicos podem ser ocupados por policiais ou guardas envolvidos em agressões. A doutoranda Jo Klinkerfus, coautora do estudo, ressalta que essa dinâmica lembra práticas da Ditadura Civil-Militar, com privação de liberdade e insegurança generalizada.
Além da violência física, o preconceito e a marginalização social são frequentes. Moradores relatam que são estigmatizados como “bandidos” ou “vagabundos”, dificultando acesso a empregos e oportunidades, e reforçando a exclusão social.
O estudo utilizou uma abordagem qualitativa, inspirada pela metodologia da Rede de Observatórios da Segurança, para compensar a ausência de dados públicos. Nenhum encontro foi gravado, garantindo anonimato e segurança aos participantes. Estudantes e voluntários transcreveram os relatos, e psicanalistas colaboraram com técnicas de escuta sensível, baseadas em experiências da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça.
O grupo planeja expandir a pesquisa para todo o estado de Santa Catarina, ampliar o diálogo com a Polícia Militar e Guarda Civil, e propor medidas de controle externo das atividades policiais, além de cursos sobre cidadania, racismo e direitos humanos na formação policial.